Salvador Peres
Querido Menino Jesus,
Dirijo-me a ti neste especial momento em que estás prestes a nascer pela enésima vez (Natal oblige). A tua santa mãe, coitada, há dois mil anos que não faz outra coisa se não dar à luz. E o teu pai terreno, que santo homem e que infinita paciência tem, velando, debruçado sobre a manjedoura, esperando o Esperado: Tu. E o burro e a vaca, pachorrentos e santarrões, bufando no esforço de produzir o calor que precisas para não sentir as agruras desse Inverno da Palestina. A Palestina, a Palestina … que lugar para nasceres, criatura divina! Um dia, nem as pedras nem o pó persistirão, tal não é o ardor do ódio. Há dois mil e tal anos, meus Deus e teu Pai, que a coisa se repete num cenário que resistiu ao tempo e não mudou. E a coisa está para durar, dois mil anos ou mais.
A esta hora, já vêm a caminho os Reis Magos e os pastores, estremunhados, quase que estão adivinhando na alvorada o Teu divino nascimento. Está tudo a postos. O Mundo já sabe quem és e o que representas, mas finge que não sabe de nada, à espera que nasças e que tudo se faça a preceito. Paz, amor, esperança, alegria, felicidade, eis o que todos esperam da quadra. Tanta gente na expectativa, todos debruçados sobre a manjedoura, como teu santo terreno pai, José, e o Outro, espreitando, quieto, lá em cima, deixando tudo como está, para não estragar a festa.
O Presépio está a postos, falta nasceres. A tua representação já lá está. Deitado nas palhinhas, ou nas palhinhas deitado, consoante e conforme dê jeito à rima. Falta nasceres, cumprires a tradição, formalizares o acto e descansares os espíritos de milhões de cristãos, novos e velhos, mais e menos crentes, menos ou mais tementes a Deus teu Pai. Gente que espera que nasças as mais das vezes porque sim, porque acreditam que em tu nascendo o sol não lhes faltará no raiar de todas as manhãs.
Feliz Natal