No Hotel Infinito cabe sempre mais um

Salvador Peres

Incognoscível, inexplicável, incomensurável, absurdo, paradoxal, o infinito domina, apesar de tudo, a linguagem do nosso quotidiano. Na vida, há uma infinidade de coisas a fazer. O amor verdadeiro é infinito. O nosso olhar, quando fixamos o céu nocturno, e pensamos na imensidão que se desdobra sem fim à vista, está a olhar para o infinito. O conceito existe e é aplicado no cálculo matemático. E a física moderna não o dispensa na elaboração teórica sobre a génese e a evolução do cosmos.
Das muitas leituras e conceitos sobre o infinito, revisito muitas vezes a Parábola do Hotel Infinito, de David Hilbert.
Imaginem um hotel com um número infinito de quartos. Está sempre lotado: todos os quartos estão ocupados. Mas, por estranho que pareça, há sempre espaço no Hotel Infinito. Uma noite aparece um cliente a perguntar se há um quarto livre. A recepcionista não se atrapalha e diz: “Sim, há sempre lugar aqui no Hotel Infinito. Dê-
me só um segundo”. A recepcionista pega no altifalante e diz aos ocupantes dos quartos: “Façam as malas e preparem-se para mudar para o quarto ao lado”. Dito isto,
a pessoa do quarto um vai para o quarto dois. A pessoa do quarto dois vai para o quarto três e por aí fora. Pode pensar-se que haverá problemas porque os quartos
estão todos ocupados. Mas, como é um Hotel Infinito, os números nunca acabam. O um pode passar para o dois e o dois para o três, o um milhão pode passar para o um
milhão e um e assim sucessivamente. Então, todos os hóspedes vão para o quarto ao lado, o que significa que o quarto um está livre e o novo cliente pode ser hospedado.
Mas, pergunta-se: não podiam mantê-los todos nos mesmos quartos e pôr o novo hóspede no fim? Assim não se mudaria toda a gente só por causa de uma pessoa.
Parece ser uma boa ideia. O problema é que não há último quarto. O infinito não funciona assim. Temos sempre de começar pelo princípio, porque não há fim.
Parece que só no universo houve um princípio, não se vislumbrando um fim. Um paradoxo para nós, que, contrariamente ao cosmos, nada sabemos do princípio, mas
achamos saber tudo acerca do fim.

 

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