Salvador Peres
O senhor Leão deixou de ver televisão
Diz que há só acidentes, muitos atropelamentos
De mota, de carro, de trotineta, alguns de bicicleta
E crimes, ainda mais, filhos que matam pais
Tiroteio e metralha por dá cá aquela palha
Inundações, terramotos e outras aflições
Guerras, então, é dia sim, dia não
A morte sai diariamente à rua, nua e crua
Leão ficou desorientado, tonto, angustiado
Como tinha o comando à mão, desligou a televisão
Meteu-se a caminho, a pé, e entrou num café
Estava a dar o telejornal e tudo corria mal
Um míssil voando baixinho entrou na casa do vizinho
Um, disparou com razão; outro, com razão, retaliou
E ninguém queria parar, havia muito míssil para atirar
A razão, nua e crua, cada qual ficasse com a sua
Os comentadores falavam à desfilada e não diziam nada
Os políticos, em reuniões, jaziam indecisos tropeçando nas decisões
Razão tem o senhor Leão em desligar a televisão
Claro está que não vai resolver nada, esteja ela acesa ou apagada
O mundo segue o seu destino no meio deste desatino
Aconteça o que acontecer, que seja o que Homem quiser
Que dos céus não vem um sinal: Deus não vê o telejornal.